Naquela noite, depois de um estudo de Vedānta Advaita, o grupo de amigos permaneceu em roda, saboreando o silêncio que segue as palavras. Foi então que alguém comentou:
— Precisamos nos preparar! Se não estivermos prontos quando o bonde passar, ficaremos no ponto, sem embarcar, e o bonde seguirá adiante sem nós.
Todos assentiram, até que outro amigo, sorrindo de lado, retrucou:
— Mas quem disse que estamos fora? Na verdade, já estamos dentro do bonde. Só não nos demos conta ainda.
Um terceiro não se conteve e, rindo alto, revelou:
— Meus amigos, vocês complicam! Não apenas estamos dentro do bonde… nós somos o próprio bonde!
A gargalhada geral já ecoava quando uma amiga, com brilho nos olhos, acrescentou:
— E se eu lhes disser que o bonde está dentro de nós?
O grupo caiu na mais gostosa risada da noite. Se alguém passasse e ouvisse aquela conversa, certamente acharia que éramos um bando de amigos embriagados, discutindo alegremente num bar. Mas no fundo, estávamos embriagados sim — não de vinho, mas do néctar da vida, da alegria de caminhar juntos em busca da Verdade.
O episódio, apesar de divertido, traz em si um reflexo profundo do caminho do Advaita. Cada visão sobre o “bonde” representa uma faceta da jornada espiritual: o buscador que teme perder a oportunidade, o que percebe que já chegou, o que reconhece que não há buscador nem meta, e, por fim, a intuição de que tudo está contido em nosso próprio Ser.
Recordei então as palavras de Sai Baba sobre a importância do humor na espiritualidade. O riso não é um desvio da senda, mas parte dela: ele quebra as armaduras do ego, dissolve a rigidez da mente e nos aproxima da simplicidade do coração.
Naquele instante, já não havia bonde, ponto de parada, buscadores ou caminho. Havia apenas uma alegria silenciosa que transbordava em gargalhadas. Era o Ser brincando de se reconhecer.
Texto: Rene Ugalde
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